Homenagem do Confrade Francisco Custódio Neto, titular da Cadeira nº 01 do IHG-CPA, ao seu falecido professor e também membro fundador deste sodalício, em que ocupou a Cadeira nº de 22.

 φιλία: Amizade Monsenhor Lefort 

Após três meses de férias, retornei às aulas na primeira semana de março. Procurei o colega de turma Antônio de Aguiar, natural de Nepomuceno, hoje aposentado da Telemig, residente em Varginha, o qual me pôs a par do andamento das aulas e falou sobre os professores as novas disciplinas do 5º ano ou 1º do curso clássico. E adiantou: nesta semana, teremos sabatina de grego. O professor é Mons. Lefort. Já houve aula sobre o alfabeto grego, pronúncia e flexão de palavras. Dizem que, quando o aluno não responde ao questionário oral ou erra todas as respostas, ele esbraveja e manda o estudante se entender com o Reitor. Isso, nos idos da jovem guarda, caso acontecesse, seria como o apocalipse no Seminário. Os colegas colaboraram, pus as matérias em dia, e me preparei para a sabatina de grego, como se dizia na época. Em dia e hora aprazados, entrou apressadinho o professor de grego, em sua batina preta à moda de São José de Anchieta, como se fosse escrever o poema da Virgem Maria sobre as areias, fez a oração de praxe, também apressado como era seu estilo. Era Monsenhor José do Patrocínio Lefort. Trazia sob a axila esquerda apenas a gramática de grego, de sua autoria. Em pé, atrás de modesta mesa, correu um olhar sereno pela sala, como a espreitar um ponto especial, e chamou, com aquela voz aveludada, meio abafada, Francisco Custódio. Iniciou o interrogatório. Por que faltou às aulas? O Reitor, Mons. Domingos Prado da Fonseca me autorizou a concluir meu contrato de trabalho de férias, e retornar aos estudos nesta semana. Estudou a lição de hoje? Estudei, sim Senhor. Recite o alfabeto. Sob o olhar atento dos colegas, iniciei a recitação, sem pausas, alfa, beta, gama, delta, épsilon, zeta, eta, teta etc. Quando pronunciei ômega, não oméga, como diz o vulgo, seus olhos brilharam e houve na sala certo alívio. Nesse dia, nasceu sólida amizade entre nós e cresceu minha admiração pelo professor de Grego, Literatura Portuguesa, Latim e Gramática Histórica da língua vernácula. Ele que foi filólogo, historiador, genealogista, filatelista, numismata (especialista em moedas e medalhas) entre outras atividades intelectuais a que se dedicou, é admirado e respeitado não só pelos membros do clero, mas também por todos os que se dedicam ao estudo e à pesquisa especialmente os interessados nos fatos históricos da Campanha. Ao completar um quarto de século de seu falecimento, ocorrido em 15 de dezembro de 1997, com renovada emoção, homenageio Mons. Lefort, meu professor de humanidades. Há 25 anos, despediu-se de nós o cidadão, o estudioso, o sacerdote humilde, espontâneo e sincero no ser e no fazer. Ícone que se destacou entre seus pares e na sociedade sul mineira por suas virtudes no exercício do ministério sacerdotal e pela dedicação e competência intelectuais. Por volta dos anos 70, quando iniciei a carreira profissional no magistério, trocávamos experiências linguísticas e literárias especialmente na área filológica em que ele trafegava com segurança e profundidade. Verdadeiro mestre a quem sempre recorri nas dificuldades gramaticais. Por esse tempo ainda não era familiar por aqui a linguística como disciplina das grades curriculares. Entre as obras destacadas em sua bibliografia, teve a humildade de me pedir breve parecer sobre o opúsculo Nhá Chica. Memória brilhante e privilegiada tinha Mons. Lefort. Em saraus, sessões literárias e culturais, costumava recitar a narrativa sobre a Última Corrida de Touros em Salva Terra, conto clássico de Rebelo da Silva. Impressionava pelo tom de sua oratória ao narrar a tragédia. O Bairro Chapada na Campanha foi contemplado com a Rua Mons. Lefort, justiça que se faz à memória do exímio sacerdote, homem de letras, pesquisador e historiador, o baluarte fé na Diocese da Campanha. Francisco Custódio Neto, professor.

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